Wednesday, June 07, 2006

Capítulo 1 (parte 3)

Voltei a olhar em meu redor e tive um dejá vue.
Estava na entrada do colégio religioso onde estudei. Tudo em mosaico, gradeamentos de ferro, as paredes de azulejo cor- de- rosa, a imagem de Nossa Senhora de Fátima logo à entrada, com flores frescas...
Despertei deste quadro com a voz da mulher vestida de cinzento, guarda prisional, que me fazia perguntas e eu não a ouvia.
Mandou-me sentar, perguntou-me alguns dados pessoais e depois, olhando para mim disse-me, - Não estejas com medo, vou-te arranjar um quarto com pessoas decentes ... ficarás bem. Se tudo correr bem, vais ao TIC (Tribunal de Instrução Criminal) e vais para casa.
Eu nada dizia, pouco a ouvia pois o silêncio pesado daquele local sobrepunha-se à voz dela.
Revistaram a minha mala, revistaram-me a mim (esta primeira vez com algum cuidado e respeito) e conduziram-me por aquele pavilhão de pedra, frio, deserto, um silêncio de morte, sem ninguém...
Eu olhava em redor e a estrutura parecia-me familiar... conseguia rever onde ficava a sala de aula de Português, o laboratório de Física, o bar convívio, a sala da Madre Superiora e via-me feliz a correr por ali dentro, ainda menina.
Subimos a escadaria, passámos por mais gradeamentos de ferro (aos quais chamam gradões), e entrámos no segundo piso, cheio de portas de ferro ao longo do corredor.

Tudo cor de rosa.
Hoje sei que cá dentro, cor de rosa, só mesmo as paredes e as portas.
Parámos em frente a uma porta de ferro e, quando a guarda abriu o pesado ferrolho, novamente despertei para a realidade.
Ela, à medida que ia abrindo os ferrolhos e a pesada fechadura, dizia - Chegámos... as que estão nesta cela são boas pessoas... não vais ter problemas ... não tenhas medo, ninguém te faz mal ... -.
A porta finalmente abriu-se e dentro da cela (a que sempre chamo quarto) uma rapariga, com imensa agilidade, desceu do beliche (com muita prática ...) e perguntou à guarda o que se passava.
Esta respondeu-lhe – Uma entrada! Ela vai ficar aqui hoje, depois logo se vê. Cuidem dela e emprestem-lhe pijama. A cama está feita? – a rapariga respondeu – Precisamos de lençóis, toalhas e almofada .... – a guarda respondeu - não há!

Disse-nos - boa noite - e fechou ruidosamente a porta de ferro ouvindo-se o roncar dos ferrolhos agora atrás de mim.
Uma sensação indescritível … como se trancassem a porta da minha vida.
(continua....)

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